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A
influência do café na sociedade
e na economia de Santos |
O café
chega ao Estado de São Paulo
A partir da segunda metade do século XIX, o café
teve um papel fundamental na vida econômica e social do
país, principalmente para o Estado de São Paulo
que, graças ao ciclo econômico do café,
formou praticamente 90% de suas cidades. O café chegou
ao país no século XVIII, mas só atingiu
sua verdadeira importância ao ser cultivado no Estado
de São Paulo e Minas, onde encontrou solo fértil
e clima ameno, aliados à proximidade com um centro exportador,
Santos. |

Os primeiros embarques de café
no porto de Santos, perto de 1900, já
prenunciavam o grande movimento que ele iria causar (imag. Poliantéia). |
A chegada do café
traz o progresso
Para Santos, o café foi o principal fator de desenvolvimento
a partir de 1854, uma vez que por aqui eram comercializadas
e exportadas todas as sacas produzidas no país. Naquela
época, iniciou-se um processo de mudanças na cidade.
Sacas de café aos milhares, e sempre em números
crescentes, eram comercializadas e embarcadas em navios, ultrapassando
as grandes safras de açúcar para exportação.
Com o crescimento explosivo da produção de café
produzido no interior da Província, o governo imperial
concede ao Visconde de Monte Alegre, - que se une ao Visconde
de Mauá e ao Marquês de São Vicente, - o
direito de construção e exploração
de uma ferrovia ligando Jundiaí à Santos. O Barão
de Mauá vende a concessão a uma companhia inglesa,
que construiu a São Paulo Railway. A inauguração
se deu em 1867 e foi fator determinante para o crescimento explosivo
da cidade. |

A estação São Paulo
Railway, no Valongo, por volta de 1905. Carroças aguardam
a chegada do trem com a carga de café para transportá-la
aos armazéns (foto Setur). |
A fundação
da Associação Comercial de Santos
Em 22 de dezembro de 1870 é fundada a Associação
Comercial de Santos, uma das primeiras do Brasil e a mais antiga
associação de classe do Estado de S. Paulo. Sua
função seria auxiliar os governos municipal, estadual
e federal no estudo e soluções de problemas relacionados
com os interesses econômico-sociais por ela defendidos
e coordenados. Por sua atuação foi declarada de
utilidade pública pelo governo federal em 1917. A ACS
esteve à frente do governo municipal em dezembro de 1891,
quando foram depostos o intendente e a Câmara de Santos,
bem como o Presidente da Província, Américo Brasiliense
. A ACS registrou na Junta Comercial a Codificação
dos Usos e Costumes da Praça de Santos, estabeleceu a
semana inglesa, |
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as férias comerciais, e o
montepio comercial. Conseguiu uma agência
do Banco do Brasil para a cidade, que se instalou
no andar térreo de sua sede, e a ela se deve
a abertura da Caixa Econômica, da Caixa de
Liquidação e da Bolsa Oficial do Café. |
A primeira sede
da Associação Comercial de Santos,
na Rua XV de Novembro, em bico de pena de Lauro
R. Silva |
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O ínício
do mercado oficial do café
O mercado do café profissionalizou-se rapidamente e na
cidade instalaram-se inúmeros escritórios para
a sua comercialização, armazéns para seus
estoques e indústrias de torrefação e embalagem
do produto. A mercadoria em estoque era a única disponível
para a venda, mas com o aumento explosivo do consumo mundial,
os importadores estrangeiros precisavam contar com a mercadoria
para todos os meses do "futuro". Essa mercadoria,
que só podia ser comprada na época da colheita,
obrigava os torrefadores e exportadores a adquirir grandes quantidades
do grão para estoques e suprimento ininterrupto do mercado,
criando a necessidade de grandes investimentos e o encarecimento
do produto pelos juros acumulados. O comerciante era obrigado
a empatar os estoques com o capital disponível e assim
surgiram as vendas diretas feitas para o futuro, sem dispêndio
de capital. Com esse sistema surgiram também os grandes
prejuízos, causados por fatores como a variação
do clima, o numerário, a falta de mão de obra,
a falta de organização das instituições
bancárias, os trustes, etc. Para o comércio santista,
foram particularmente amargas as consequências desse sistema
entre os anos de 1912 e 1914. |

Embarque de café em 1907 - o navio
é a vapor e a construção à direita
é uma
casa de máquina a vapor que fornecia a energia para os
guindastes e para a
iluminação do cais (img. M.Serrat) |
A Caixa de Liquidação
e o mercado desorganizado
Para evitar esses prejuízos fundou-se em Santos, a exemplo
do que ocorria na Europa, uma Caixa de Liquidação
regulada pelo sistema de depósitos e margens financeiras,
afim de garantir as operações do futuro. Todas
as operações eram registradas nessa Caixa, que
dispunha de um livro aberto onde se conheciam os negócios
alheios. Este sistema também não funcionava a
contento, pois forçava a alta ou a baixa da mercadoria
de acordo com a sua conveniência, o que continuou causando
grandes prejuízos na cidade. Os comerciantes, através
da Associação Comercial, pressionavam o governo
para que se fundasse uma instituição que efetivamente
garantisse os negócios futuros.
Nasce a Bolsa Oficial de Café
Desde 1906 o poder legislativo de São Paulo estudava
a criação da Bolsa Oficial de Café, aparelho
de defesa do comércio sob direta fiscalização
do Estado. Pela Lei 1416 de 14 de julho de 1914 foi criada a
Bolsa Oficial de Café e a Câmara Sindical dos Corretores
de Café de Santos, objetivando um maior controle do comércio
do café. A lei foi regulamentada pelo decreto nº
2516 de 23 de julho do mesmo ano e, por ela, todos os contratos
de compra e venda de café a termo só seriam válidos
quando negociados por um corretor oficial da Bolsa e registrados
em Caixa de Liquidação. O presidente da Bolsa
era um comerciante nomeado pelo Governador do Estado. A Bolsa
teria uma comissão de peritos oficiais, contratados por
concurso, e somente essa comissão poderia avaliar e classificar
o café, fixar diferenças, prejuízos e bonificações
nas operações da Bolsa, sempre sujeitas ao seu
conhecimento. |

O transporte de café dos armazéns
até o porto começa a ser feito por
caminhões da marca Mercedes a partir de 1920 (col. João
Gerodetti) |
A Bolsa e a sua
primeira sede
A Bolsa Oficial de Café foi inaugurada em 2 de maio de
1917, em um salão alugado, na esquina da Rua XV de Novembro
com a Rua do Comércio. A lei de criação
da Bolsa previa a cobrança de uma taxa de 20 réis
por saca de café nas operações a termo
e destinava o produto dessa taxa ao pagamento de despesas próprias
e à construção de uma sede para seu funcionamento.
O início
da construção do prédio da Bolsa
O terreno escolhido para a construção do prédio
da Bolsa Oficial de Café ficava na esquina das ruas XV
de Novembro e Frei Gaspar, próximo ao cais do porto,
o famoso "Quatro Cantos", como era conhecido o local
desde o século XVIII. O casario decadente existente naquela
área foi desapropriado pelo governo e os projetos da
obra ficaram a cargo da Companhia Construtora de Santos, sob
a direção do engenheiro Roberto Simonsen. A pedra
oficial do edifício foi lançada a 27 de abril
de 1920 pelo então Governador do Estado Sr. Altino Arantes
e, em julho do mesmo ano, tem início a limpeza do terreno
e a sondagem para o trabalho de fundação. Para
a construção do Palácio da Bolsa Oficial
de Café foram feitos um empréstimo de 2.000:000$000
(dois mil contos de réis) e o lançamento no mercado
de um bônus de 1.000$000 (um conto de réis) com
juros de 7% ao ano. A amortização seria dada a
partir do 21º ano, sendo que o empréstimo se findaria
no prazo de 26 anos. Assim, o governo do Estado cederia os recursos
necessários para os juros e amortizações,
sempre que fossem insuficientes os recursos da Bolsa. |

Obras iniciais de fundação
do edifício da Bolsa Oficial de Café. |
A inauguração
da Bolsa Oficial de Café de Santos
A 7 de setembro de 1922 era inaugurada a Bolsa Oficial de Café
de Santos, com a presença do então governador
Washington Luiz. A construção do imponente edifício
custou 6.373:315$390 (6 mil e 373 contos de réis). O
material de construção utilizado era, em sua maioria,
importado da Europa. Consta que os mármores de cores
variadas utilizados para o acabamento do piso vieram de diversos
países, juntamente com as peças componentes das
grandes colunas externas de granito. |

Foto do dia da inauguração
do edifício sede da Bolsa Oficial de Café,
com suas colunas dóricas em granito compondo o frontão
de entrada. |
As características
do edifício Frontão
de entrada
O pórtico de entrada é grandioso, inteiramente
de granito, formado por oito colunas dóricas, encimadas
por um frontão franqueado por duas estátuas mitológicas
recostadas: Mercúrio, deus do Comércio, e Ceres,
Deusa da Terra e Agricultura, e que simbolizam a riqueza e a
fecundidade da terra. Realçando o perístolo circular,
a cúpula que cobre a entrada principal serve de abrigo
coberto aos terraços superiores. Na parte central, as
arcadas são abundantemente decoradas com guirlandas de
folhas e grãos da rubiácea, simbolizando a importância
do intenso movimento das transações de café.
No frontão, esse signifidado se completa com atributos
esculpidos, simbolizando a cultura, a colheita e a venda do
produto. A
imponente torre dá as horas à cidade
A imponente torre de 40 metros de altura traz no topo um belvedere
crivado com quatro gênios, que simbolizam a indústria,
o comércio, a lavoura e a navegação. Em
cada uma de suas quatro faces, um grande mostrador do relógio
suíço "Magneta" indicava a hora oficial
à grande parte da cidade e do porto. A torre mais baixa,
na entrada, tem a cúpula coberta de folhas de cobre e
é encimada por um mastro no qual se hasteava a bandeira
nacional. |

Bolsa Oficial de Café em foto dos
anos 20 - majestoso edifício
e magnífico patrimônio de nossa cidade (foto Setur). |
O interior do
edifício
O edifício tem 3 pavimentos. No térreo encontram-se
o saguão, a sala de pregões, a secretaria e a
sala da presidência. No segundo andar, a galeria, dando
vista para o salão de pregões abaixo, a Sala de
Classificação de Café e demais dependências.
No terceiro pavimento, um luxuoso restaurante, cenário
de grandes negociações. O interior do edifício,
totalmente trabalhado em relevo, é decorado com mármores
variados, objetos de bronze franceses, vitrais luxuosos e cristais
belgas. O destaque fica para o Salão de Pregões,
com cadeiras de espaldar alto feitas em jacarandá, onde
se sentavam em roda os comissários durante as seções
de pregão. Uma das paredes é decorada com três
grandes painéis de Benedicto Calixto, retratando a cidade
em três épocas: "Fundação da
Vila de Santos em 1545" (na qual o capitão Braz
Cubas lê o foral da vila e inaugura o pelourinho no pátio
da Casa do Conselho), "O Porto de Santos em 1822"
(visto da Ilha Braz Cubas) e "Porto de Santos em 1922"
(visto do Morro do Pacheco). Nos quatro cantos de cada quadro,
Calixto pintou brasões referentes ao Brasil Colônia,
Império e República e suas molduras retratam a
fauna brasileira.
No teto, outra obra de Benedito Calixto, transformada em vitral
pela famosa Casa Conrado, de Conrad Sorgenich, retrata a visão
de Anhangüera, "que viu emergir das águas a
mão de ouro distribuindo paletas de ouro às mães
d'água, como se fossem centelhas de luzes fosforecentes
espargindo-se sobre as cabeças de sua população".
Dos outros dois lados, gravado com genial concepção,
o Brasil Colônia representado pela riqueza de sua fauna
e por seus animais selvagens, o Brasil Império, com sua
incipiente lavoura e seus animais domésticos e o Brasil
República, próspero com suas indústrias
e seu comércio organizado. À volta toda, seis
retratos de bandeirantes que contribuíram para a grandeza
de nossa terra. |

A Rua XV de Novembro e a Bolsa de Café
ao fundo. A agitação
da rua é ilustrativa do volume de negócios envolvendo
café
no início do século XX (foto de Boris Kauffmann). |
Aspectos relevantes
das atividades da Bolsa
A Bolsa Oficial de Café viveu muitos anos de influência
na atividade comercial e econômica do Município,
cumprindo à risca os objetivos que determinaram a sua
criação. Em setembro de 1924 o Decreto-Lei 12.930
modificou a sua denominação para Bolsa Oficial
de Café e Mercadorias, objetivando centralizar e sistematizar
as operações de mercadorias em geral, apurar,
registrar e divulgar diariamente os preços correntes
e a situação do mercado. O
crack de 1929 e a queima do café
A Bolsa teve seu auge entre 1917 e 1929, ano da quebra da Bolsa
de Nova York, que lançou praticamente o mundo inteiro
em um período de depressão. Para a nossa "República
do Café", juntaram-se dois ingredientes explosivos:
a superprodução e a queda dos preços no
mercado internacional. Para completar a gravidade da situação,
os estoques do grão eram elevadíssimos.
A solução do governo federal para a crise foi
a queima de estoques para que a falta do produto forçasse
a alta dos preços. Diversas propostas foram apresentadas
para a queima. A "Folha da Manhã" de 3 de janeiro
de 1932 informava sobre experiências do uso de café
como combustível nas locomotivas da Central do Brasil:
"Partiu um trem de carga com 610 toneladas de peso, utilizando
a locomotiva café como combustível. O percurso
foi vencido em duas horas e dez minutos, sem quebra de pressão,
gastando 2.912 quilos de café."
Nas imediações de Santos, milhares de toneladas
de café foram incineradas em fogueiras que ardiam durante
dias desprendendo uma fumaça aromática - 71.068.581
sacas de café foram queimadas, quantidade que daria para
atender o consumo mundial por três anos. |

Imagem de um dos armazéns da cidade
no final dos anos 20. No
armazém o café era selecionado, beneficiado, testado
e ensacado.
De cada lote eram retiradas amostras para a sua comercialização. |
O fechamento da
Bolsa e a criação do IBC
A partir da grande crise de 1929, as atividades da Bolsa Oficial
de Café foram decrescendo. Em 1933 foi criado o Departamento
Nacional do Café para controlar a economia cafeeira.
Em 1937 a Bolsa de Café foi fechada por tempo indeterminado.
Reabriu algum tempo depois, em 1942, mas o comércio do
café não se recuperou, ao contrário, acentuou-se
ainda mais a sua decadência. Em 1952 foi criado o IBC
- Instituto Brasileiro de Café, quando uma nova crise
exigiu intervenção estatal. A partir de 1960,
um novo fator influi no mercado internacional do café:
a criação do café solúvel, que vem
transformar as transações. A
mudança do pregão para São Paulo e o prejuízo
para a cidade
Na década de 80 o pregão é transferido
para a Bolsa de Mercadorias e Futuros de São Paulo. Das
atividades originais da Bolsa Oficial de Café, somente
funcionava o setor de classificação. Em 1981 o
edifício foi tombado pelo Condephaat e, em 2006, pelo
Iphan, preservando-se para sempre o maior símbolo da
história econômica de Santos. A
Bolsa Oficial de Café hoje
A Bolsa Oficial de Café é um marco da fase áurea
do produto que criou grandes riquezas e patrimônios. Os
chamados "barões do café" construíam
seus palacetes e mansões na orla, proporcionando beleza
à paisagem e colocando nossas praias entre as mais aristocráticas
do mundo naquela época. A riqueza dos santistas se traduzia
na expansão urbanística da cidade e na grandeza
de seus monumentos. Por tudo o que o café representa
na história da cidade é que os santistas reinvindicaram
por longo tempo ao Ministério da Agricultura, proprietária
do edifício, o estabelecimento de um Museu do Café
em |
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suas dependências. Em 1996
o Governador Mário Covas instituiu Comissão
Especial integrada por sete comerciantes tradicionais
de café coordenados por Eduardo Carvalhaes
Jr., afim de estudar projeto para a instalação
do museu. As obras de revitalização
se iniciaram com a reforma externa e, na parte interna,
com a restauração dos murais de Calixto,
da sala de pregões, saguão e galerias
- o restante permanece fechado. Em 1999 o Museu
abriu ao público com festa. Em uma parte
do imenso saguão se instalou um café
para quem quiser desfrutar a boa bebida proporcionada
pelo que foi o nosso "ouro verde". |
Detalhe da fachada
da Bolsa Oficial de Café depois de sua restauração
total, finalizada em 1999. |
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